quinta-feira, 7 de outubro de 2010

O Rio de Janeiro e a Música


O Rio de Janeiro não é mais o mesmo de antigamente. A cidade sofre com constantes perdas, sejam econômicas, culturais ou políticas. Estas perdas podem ser observadas quando analisamos o processo histórico do Rio de Janeiro e percebemos como este território, que já foi capital do Brasil hoje é apenas uma cidade capital de seu estado.
Mais precisamente, sobre a música no Rio de Janeiro, pode-se dizer que a cidade viveu quatro épocas diferentes em que houve rompimentos bruscos de um estilo musical para outro. Foram o Samba, a Bossa Nova, o Rock e o Funk, que em períodos distintos, deram o tom musical da cidade maravilhosa, não só da maravilhosa, mas também de Duque de Caxias, Niterói, Nova Iguaçu entre outros municípios do estado, do Brasil e até de outros países, como ocorreu com o Samba e Bossa Nova principalmente.
O Samba, primeiro deles, tinha sua musicalidade apreciada pelos mais diversos grupos sociais como os negros miscigenados com os portugueses, a Igreja e respectivas procissões e também a Umbanda. Mas o principal ingrediente da inventividade do sambista vinha do carioca pobre, o ritmo, a ginga, o rebolado e a sedução nas ruas cariocas, bares de esquina (de preferência bares de um português), mas principalmente, dos morros cariocas. Desde sua época áurea até hoje o Samba contou com vários grandes e importantes nomes da música brasileira como Alcione, Baby do Brasil, Beth Carvalho, Bezerra da Silva, Braguinha, Carmen Miranda, Cartola, Clara Nunes, Gal Costa, Ivone Lara, Martinho da Vila, Noel Rosa, Pixinguinha entre tantos que o Rio de Janeiro foi inspiração. O Samba talvez seja o gênero musical brasileiro de maior talento agregado.
A Bossa Nova surge nos anos 50 e 60 do século XX, e tem a cidade como cenário de inspiração, sendo essa inspiração traduzida pela bela imagem do Rio no estrangeiro até porque a música reproduzia muito as riquezas naturais da cidade, se fala muito de praias, mar, montanha e céu mostrando o Rio como um paraíso em forma de cidade. Mas o estilo musical é de forte influencia norte-americana apesar de, segundo Tarik de Souza, a inovação dentro da Bossa Nova ter forte influencia do Samba. Na Bossa Nova a voz era falada (em contra ponto ao vozeirão), os cantores são também compositores e surge também a forte atuação empresarial, que procuram gravadoras aos que se destacam.
Surge numa época em que a indústria fonográfica ainda não era tão decisiva, ainda engatinhava. Afirmam que a Bossa Nova é produto da Zona Sul, porém há exemplos de pobres que se destacaram e ganharam dinheiro depois como João Gilberto e Sérgio Mendes. O Samba e a Bossa Nova foram estilos que tiveram como meio de projeção o rádio, os jornais nem todos liam e a televisão era muito cara, logo o que valia mesmo era a fama, bom nome e bons serviços, a credencial dos músicos.
O Rock, terceiro dos estilos, é muito mais paulista e brasiliense que propriamente carioca, porém o Rio de Janeiro foi plataforma de projeção principalmente pelo Rock’n Rio em 1985 e o Circo Voador. Concomitantemente, a estrutura empresarial ganha importância, crescia a indústria fonográfica e o Rock se forma como um fenômeno televisivo que não é praticado por pobres porque sua estrutura instrumental era muito cara.
O Funk chega em contra ponto ao hip hop paulista e norte-americano e com alguns ingredientes a mais como o bom humor e o teor erótico, porém ele é muito mal visto principalmente por sua vinculação ao tráfico e, com isso, ao contrário dos estilos anteriores, tem uma grande dificuldade de veiculação.
            Por diversos motivos o Rio vem deixando de ser a cidade da música no país. Os mais marcantes desses, talvez sejam a pouca renovação musical e a perda de talentos como analisa o músico Paulo César Pinheiro, que no programa de TV Por Acaso na TVE em 14/01/2004 relacionou uma lista altamente qualificada de perdas na música carioca como Baden Powell, Rafael Rabello, Maurício Tapajós, João Nogueira e Tom Jobim.
Zélia Duncan, cantora brasiliense de residência no Rio de Janeiro, no mesmo programa só que em 11/05/2003 assinala que a música atual apresenta falta de encanto e estética e que, há talentos sim, mas estes não estão antenados a um movimento musical como Lenine e Chico César e, mesmo assim, são talentos que já estão na faixa dos trinta anos.
A perda da centralidade (principalmente para São Paulo) se revela na confissão de André Midani, executivo da área musical de grande importância na promoção da Bossa Nova e Tropicália, de que tem mais campo de trabalho em São Paulo do que no Rio de Janeiro. E, no programa Conexão Roberto D’Ávila em 07/12/2003 e reprisado em 08/02/2004 na TVE (mesmo ambiente da confissão citada), ele sugere que o processo político interferiu na música uma vez que alguns talentos dos anos 80 estavam muito comprometidos com o processo de reabertura política e, quando este se consolida, fica um vácuo na produção desses talentos.
O último fator (um dos responsáveis pela queda qualitativa da música carioca) se relaciona diretamente a mudanças na indústria fonográfica que tem diversas conseqüências na produção musical. Uma delas é a substituição do diretor artístico pelo diretor de marketing; isso vai fazer com que haja cada vez mais vendagens, mesmo que com pouco talento, escanteando a produção de sucessos. Além disso, há também o surgimento de um monopólio do som reproduzido em rede de lojas, shoppings, acesso a estação de rádio, programas de TV e, principalmente, novelas.
Tudo isso tem início nos anos 80, juntamente com a perda do sentido da melodia e essa se transformando em código; códigos veiculadores de controle e meio de propaganda, ou seja, apresentações com seus atrativos ligados ao técnico de efeitos visuais majoritariamente em detrimento do próprio músico.
Um momento no qual o Rio de Janeiro consegue se recuperar e voltar a ser o centro das atenções do espaço musical, são os dias em que ocorre o carnaval na cidade, onde o desfile das escolas de samba chega a ser transmitido para mais de cem países. Durante esse pequeno espaço de tempo (cerca de cinco dias) a cidade recebe turistas do país e do mundo inteiro, não somente celebridades, mas pessoas comuns, ricos e pobres. O carnaval tem essa característica, enquanto os dias de desfiles no sambódromo da cidade concentram políticos, artistas e outras celebridades brasileiras e mundiais, os blocos de rua conseguem ainda hoje aglomerar um imenso contingente populacional e atrair turistas de diversos lugares.
Vários estudos acerca do carnaval foram realizados por diversos cientistas. Roberto DaMatta, passou a compreender o Brasil através do carnaval, principalmente o carnaval carioca. DaMatta, inclusive, acredita que a educação sentimental do brasileiro passa pelo carnaval, assim como a enorme herança da escravidão, do analfabetismo e o processo de socialização brasileira passa pela musica. O carnaval seria então o meio pelo qual a população brasileira se une, a sua identidade, o que torna o brasil, Brasil.
Durante as festas desse período, os rituais buscam proporcionar um contraste entre o mundo cotidiano e o não cotidiano, o real e o abstrato, e expressa a estrutura social do brasileiro, onde observamos a realidade brasileira de forma dramática, no qual o povo apresenta a sua batalha entre o permanecer e o mudar. Estas expressões são caracterizadas pela informalidade. Tal fato é comprovado quando se compara o carnaval a outras festas do país como o Dia da pátria, controlado pelas forças armadas e Semana Santa, controlada pela igreja. O carnaval é controlado pelo próprio povo, de forma pouco hierarquizada, onde pessoas pobres podem se tornar reis e pessoas ricas desfilam ao lado de pessoas pobres. É a festa do povo, uma festa na qual ricos e pobres se igualam.
No entanto, a musica sofreu uma mudança de ideais. A ascensão do empresário fez com que grandes corporações emergissem no cenário,  superando até o estado nacional por serem empresas que não dispõem de nacionalidade nem pátria, não possuem identidade cultural e visam sempre o lucro financeiro. Com o aumento de importância dessas empresas, a cultura musical começa a se padronizar a níveis nacionais e até mundiais. Com isso, a bossa nova e o samba perdem cada vez mais espaço, já que são estilos musicais que surgiram na relação direta entre as pessoas e a musica, na qual as letras representavam o dia-a-dia, costumes e cultura de uma maneira geral, as musicas possuíam letra, possuíam historia. Ao contrario, no rock e no funk os músicos passam a fazer parte de uma logística de mercado, na qual as letras não surgem mais tão naturalmente, é preciso produzir sempre, novas musicas que abasteçam o publico, sempre os entretendo. O musico cada vez mais deixa de ser amador e passa a ser um profissional da área, cria-se uma espécie de nova indústria cultural onde não se pode mais esperar surgir um talento, não existe mais tempo sobrando para isso, então, torna-se necessário a fabricação do talento.
Essa mudança pode ser enxergada de forma mais direta quando se observa a evolução do carnaval no Brasil, mais precisamente nas cidades do Rio de Janeiro e São Paulo. O carnaval carioca sempre foi elogiado e reconhecido mundialmente, sempre foi o abrigo dos principais sambistas e das principais escolas, tendo nos desfiles a valorização dos sambas e da festa do povo. Ao contrario, o carnaval paulistano foi inserido de maneira não natural, com muito mais dinheiro investido do que talento, lá as escolas de samba não possuem raízes históricas sendo representadas até por times de futebol como é o caso da Gaviões da Fiel (escola de samba da torcida do Corinthians) e a Mancha Verde (escola de samba da torcida do Palmeiras) e hoje conseguem também audiência tão grande quanto o carnaval da “cidade maravilhosa”. Um dado curioso, é que o presidente da República, escolheu uma escola de samba paulista para representar o samba brasileiro numa viagem do governo federal ao Oriente Médio em 2003, onde o mais indicado e comum em outros tempos, seria a escolha de alguma escola de samba carioca como a Portela ou Mangueira. No ano de 2004 a escola de samba escolhida pelo presidente foi rebaixada no desfile das escolas de São Paulo.
Alguns aspectos importantes a serem ressaltados, são que essas alterações todas ocorreram devido à mudança das relações entre as pessoas durante o passar das décadas e a inclusão do empresário que enxergou na musica uma maneira a mais de ganhar dinheiro. Ser musico hoje significa ser um profissional da musica, ao contrario do que ocorria no passado onde ser musico representava ter o dom de compor ou de cantar ou tocar algum instrumento. A evolução da economia também foi importante, já que a construção de shoppings cada vez em maior quantidade e em maior tamanho acaba por eliminar por concorrência pequenos bares que serviam de ponto de encontro das pessoas, o aumento do crime na cidade também é um fator relevante, já que associado as favelas, criam uma separação entre a população “informal” e “formal”, fazendo com que o acesso aos morros, considerados berços do samba, se tornem cada vez menores e com isso o samba tenha menos audiência e renovação. O surgimento da internet também é importante nesse processo, esta que teoricamente serviria para aproximar as pessoas acaba por separar, já que os encontros entre as pessoas tornam-se menos freqüentes e as conversas passam a acontecer pelo computador, tornando as relações intrapessoais cada vez mais frias e robotizadas.
            Com isso, o Rio de Janeiro acumula mais uma perda dentre outras muitas, já que anteriormente já deixara de ser a capital do país, a capital do futebol, deixou também de ser um estado da federação com a fusão dos estados da Guanabara e do Rio de janeiro, perdas nos setores portuário, cultural e financeiro e por fim a musica. Perdas essas que foram influenciadas também pela mídia, já que problemas relacionados a cidade eram sempre lembrados por telejornais e outros veículos de informação, sucessivamente com mais atenção do que em outros estados, de certa forma rebaixando a cidade sempre que possível. Isto fez com que o Rio de Janeiro deixasse de receber investimentos maiores de empresários além de perder muito no setor de turismo por exemplo. A cidade sobrevive graças ao seu passado, o turismo é um bom exemplo disso, onde os visitantes chegam aqui a procura das belezas naturais, do povo acolhedor, do carnaval e da bossa nova, procuram o “estilo de vida carioca”, e quando chegam aqui encontram uma realidade completamente diferente, uma cidade que sofre forte influencia do tráfico de drogas e armas, que exerce uma espécie de poder paralelo, sendo em muitos locais da cidade mais poderoso que os próprios governantes do Estado.
            Pode-se então perceber que a perda da centralidade musical na cidade se deu em muito a processos de perdas ocorridos na região, que tornaram cada vez mais difícil a renovação de talentos musicais, combinada com a presença da indústria musical cada vez mais. Essa indústria que visa sempre o lucro cria os novos talentos, cria os novos ídolos, não se preocupa se a pessoa sabe cantar ou não, basta ter um rosto bonito que os efeitos visuais e efeitos sonoros se encarregam de garantir o entretenimento do publico. As musicas não possuem mais uma mensagem, um recado a transmitir e também não nos fazem recordar de momentos de nossas vidas, como sentimentos nostálgicos e sim nos causam uma sensação de hipnose, com batucadas, ou frases repetitivas que deixem o ouvinte congelado naquele momento.
            A cultura foi transformada em entretenimento, e com a música não foi diferente. A música serve hoje como um meio e não mais como um fim, em uma academia, por exemplo, as pessoas escutam musicas não para apreciá-las, mas para se sentirem “ligados” e conseguirem fazer suas atividades em um ambiente mais agradável de acordo com a situação. A música não mais enaltece o passado, nossos heróis, ela enaltece o EU, e nisso observamos como que o Rock e o Funk representam bem esse período dominado pelos empresários. Ao compararmos as letras de hoje com as de Samba ou Bossa Nova temos ah, eu tô maluco ah, eu tô maluco com as rosas exalam o perfume que roubou de ti...é possível perceber claramente a mudança de estilos entre os períodos. Os estilos mudaram, hoje o Funk representa o principal estilo de música carioca, o que está na moda, uma música caracterizada pela descontração, voltada para os jovens. O maior problema estaria no fato deste estilo ser comumente ligado a criminalidade na cidade, por ter suas origens nas favelas e nas populações de baixa renda. Analisando a evolução dos estilos, percebe-se que o principal problema está na ambiência carioca, o crime, a evolução tecnológica e o avanço da economia de certa maneira acabaram com os encontros e reuniões entre as pessoas, que passam a ocorrer por telefone ou internet por exemplo. O talento não é mais cultivado, não se valoriza mais uma pessoa talentosa, valoriza-se o que a indústria musical nos empurra de todas as formas.

Debate adiado

O debate sobre violência, narcotráfico e jogo do bicho foi adiado para o dia 25/11/2010, o local continua o mesmo (sala 201 do Instituto de Geociências da UFF) assim como o horário (15h).

domingo, 3 de outubro de 2010

Próximo tema de debate

     Na Quinta-feira, dia 28/10/2010, ocorrerá o próximo encontro aberto do Grupo Rio. O encontro será realizado na sala 201 do Instituto de Geociências da UFF, às 15h.

   
     Tema de debate:  Rio de Janeiro: Violência, jogo do bicho e narcotráfico segundo uma interpretação
    
     "Querido Rio de Janeiro, ao conhecer teus caminhos, teu passado, muito me desperta orgulho. És do mar desde a sua fundação propiciada pelo excelente sítio da Baía da Guanabara, por sinal, muito bem utilizada pela metrópole lusitana. Demoraste a ocupar a serra, isto só ocorreu com o café. Sempre estiveste acompanhado pelo sol, um sol forte, que tantas cores desperta na paisagem, particularmente no verão.
     Afora teu aspecto físico, abençoado pela prodigiosa combinação de serra, mar e lagoa, destaco teu passado político.
     Nasceste grande, Rio de Janeiro. Desde cedo passaste a dividir o governo da colônia com Salvador, ficando, depois, definitivamente, com a sede no século XVIII. Acorreram a ti os militares portugueses, os comerciantes, particularmente interessados no escoamento do ouro e no comércio com a Bacia do Prata.
     É, já faz tempo. Mas, permita-me continuar!
     Tu recebeste uma rainha, talvez louca, mas era uma rainha! Recebeste e ainda tem a família real! Foste o parâmetro de todo e qualquer raio de modernidade que afetava o Brasil, pois era área-piloto tanto de D. Pedro II, quanto dos presidentes republicanos!
     Tu és considerada a vitrine do país. O Brasil não é uma fazenda agrícola, ele é moderno, e tem o Rio de Janeiro. Lá temos a Biblioteca Nacional, recém-construída, o Museu Nacional de Belas Artes, o Teatro Municipal. Brasil é grande, Brasil é Rio de Janeiro!
      Mas, mas... um tiro no peito de um presidente acabou atingindo o coração de uma cidade. Aceleraram a transferência da capital para o interior do país. Viraste estado, o da Guanabara! Quinze anos depois, foste município!
     Na época não sentimos o tapete que nos era tirado, afinal, Bossa Nova, Jovem Guarda, Cinema Novo, o melhor carnaval do mundo, um excelente futebol... As praias ainda eram ensolaradas, e como ditavam moda...
     Nestes últimos vinte anos, que é o objeto de nosso estudo- Rio de Janeiro: Violência, jogo do bicho e narcotráfico segundo uma interpretação- podemos verificar uma acentuada mudança!
     Matas teus filhos, ou os deixas morrer!
     Pessoas amedrontadas pensam ingenuamente que, ao levantarem os vidros dos seus carros, estão protegidas. Isso se o vidro não for blindado!
     Pessoas carecem de oportunidades, falta emprego e feijão...
     A ação dos políticos fica cada vez mais pobre, lembra o estilo romano- pão e circo-, mas com um jeitinho peculiar pois, às vezes, sobra cacete! O Rio de Janeiro está à deriva porque o coração carioca está ficando amargo, pesado, sentido, envelhecido... vem perdendo sua jovialidade característica.
     O que fazer para reverter a situação? Desfusão com o antido estado...? Contratar mais policiais? Já foi dito tanta coisa e tão pouco foi realizado!"

     Uma carta ao Rio de Janeiro pelo professor Hélio de Araújo Evangelista.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

A Fusão e as suas consequências


            É muito importante   que se faça uma avaliação de impactos da fusão, sejam eles positivos ou negativos. Para isso alguns artigos e entrevistas são de suma importância para um balanço sobre as conseqüências da fusão.
            No artigo “O destino da Guanabara” divulgado em 15/10/2002 no jornal virtual www.nominimo.com.br , pelo jornalista Pedro Dória, usou-se uma entrevista realizada em 11/10/2002 do mesmo com o especialista no assunto Helio de Araujo Evangelista e, a partir dessa entrevista, é possível termos uma visão mais esclarecedora.
            De acordo com Helio Evangelista, o atual estado do Rio de Janeiro com a Guanabara e o interior tem nessas duas áreas muitas distinções e um exemplo disso é o turismo carioca com a Turis-Rio e a Rio-Tur em que a primeira atua em nível estadual e a segunda em nível municipal e portanto, devia ter certa subordinação à primeira porém ela age com autonomia.
            Assinala também, sobre as seqüelas, que no âmbito governamental elas se fazem presentes quando percebemos o Rio de Janeiro como um “estado que não tem memória enquanto estado”. No que diz respeito à ordem política o ponto negativo é que de tempos em tempos (principalmente em época de eleição) é incitada essa discussão como por exemplo em 1997 quando o prefeito do Rio de Janeiro da época, o Conde, e o governador Marcelo Alencar travaram discussões registradas na imprensa inclusive por uma reação do prefeito frente a uma decisão do governador de alterar a critério de alteração de distribuição do Imposto sobre a Circulação de Mercadorias que, no caso, prejudicaria a cidade do Rio de Janeiro.
            Perguntado sobre uma possível desfusão, Helio Evangelista afirma que pensa ser algo muito difícil de acontecer, houve insucesso em várias tentativas de aprovação no Congresso Nacional sobre o plebiscito junto à população e, somado a isto, a fusão nunca é lembrada em discursos sobre a (má) herança da Ditadura. Ressalta ainda que em caso de desfusão a Guanabara seria capaz de se sustentar (independente dos royalties do petróleo) pois ainda é uma cidade rica.
            É muito importante analisar também o artigo dos jornalistas Miro Nunes e Vanessa Teixeira para o Jornal do Comércio em 30/04 e 02/05 de 2000 p.A-21 no encarte sobre o Rio de Janeiro, “Economia perdeu com a fusão”. Esse artigo mostra, obviamente pelo seu nome, vários dados mostrando quanto o Rio economicamente está mais fraco.
            A matéria mostra que, 25 anos depois da fusão, uma pesquisa feita pelo IBGE mostra que o setor agropecuário, de comércio e indústria teve quedas significativas em seu faturamento, chegando a até 50% diante do total nacional. Quanto ao PIB, mostra certo declínio da participação fluminense, de acordo com o IBGE, na primeira vez em que fez esse cálculo em 1985, a participação fluminense era de 12.7% e depois em 1997 apresentou queda, com 11.2% apenas. O Rio de Janeiro nesse assunto ainda se mantém em segundo colocado nacionalmente, abaixo apenas de São Paulo e, sazonalmente, de Minas Gerais. Porém muito disso se deve a descoberta de petróleo na bacia de Campos, em meados da década de 70 e da sua exploração comercial desde 1981.
            Há ainda vários dados comparativos feitos pelo IBGE nos anos de 1970 e 1996 e, no censo comercial do primeiro a Guanabara e o Rio de Janeiro representavam 16.1% do total nacional de vendas e no segundo o percentual caiu para 15.2%. Em 1970 o VTI (valor de transformação industrial) representava 15.3%, em 1996 9.45%. Houve também quedas no setor agropecuário, de acordo com dados do Departamento de Agricultura do IBGE a participação em 1970 era de 2.6%, em 1996 1.3%. De acordo com o economista Nilo Lopes de Macedo, então membro do Departamento de Comércio e Serviços do IBGE houve decadência do setor açucareiro em Campos na década de 80 (importante fator da queda do setor agropecuário) e ainda sugere uma política efetiva de (re) industrialização como está sendo feita com o pólo industrial automobilístico em Resende, até porque, como ressalta Paulo Gonzaga (na época, integrante do Departamento de Indústria do IBGE) houve queda na produção industrial brasileira que foi de 2% e 0.7% em 98 e 99 respectivamente e, nos mesmos anos, a produção cresceu no Rio 7.2% e 6.1% pela produção de petróleo.
Mas um evento como a fusão e suas conseqüências não podem ser avaliados somente por estatísticas, o tema possui uma complexidade muito maior. Devemos observa o outro lado como mostra a professora Marly Motta, na época integrante da equipe de historiadores do Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDoc) da Fundação Getúlio Vargas (FGV) em que diz que o tema da fusão vem à tona somente em ocasiões eleitoreiras, em época de eleição. Também Helio Evangelista que mostra uma maior estabilidade de arrecadação tributária entre as cidades (60% para a cidade e 40% para o interior) e bate na tecla de que a fusão teria sido mais positiva em caso de plebiscito sendo assim resolvido um assunto de nossa memória mal resolvida que traz sempre essa questão de volta por atritos entre os governos da cidade e do estado, como César Maia e Garotinho.
Finalizando, pensar que em tempos de liberalização do mercado, ruptura das fronteiras, valorização de governos locais a desfusão é ainda mais difícil até porque a haveria perspectivas de demissão de funcionários, implicaria em uma nova assembléia, nova capital, novo estado... O grande ponto positivo dessa discussão é amenizar diferenças e traçar projetos de forma conjunta e ajudar no desafio dos governantes de superar um trauma sem ter na desfusão a solução para todos os problemas do Rio.